Sem censura
Livro ‘O avesso da pele’ é lido e estudado por alunos do curso técnico em Administração
Censurado pelos governos do Mato Grosso do Sul, de Goiás e do Paraná, o livro ‘O avesso da pele’, do escritor Jeferson Tenório foi escolhido pela professora de Literatura Elisângela Lopes, para a leitura e estudo dos alunos do 3º ano do curso técnico em Administração integrado ao ensino médio.
O livro, que foi publicado em 2020 e venceu o Prêmio Jabuti no ano seguinte, narra a história de Pedro, que teve o pai assassinado em uma abordagem policial. A obra apresenta questões raciais que vão desde o racismo estrutural à violência policial, e trata ainda da fetichização e sexualização de corpos negros.
“Quando iniciamos a aula, alguns alunos já estavam cientes da absurda censura que tem como alvo o romance de Jeferson Tenório, mas eu disse a eles que muito mais importante do que isso era a leitura da obra, até porque, diferentemente da postura dos censuradores, nós só poderíamos omitir opinião sobre o romance depois de lê-lo”, disse a professora.
De acordo com as secretarias de educação dos Estados que censuraram ‘O avesso da pele’, a obra apresenta “expressões impróprias” para menores de 18 anos, e que, por este motivo, precisaria ser reavaliada ou retirada das bibliotecas das instituições.
Para a professora de Literatura o motivo a verdadeira razão pela censura “é a denúncia do racismo estrutural que o livro concretiza nas palavras de Pedro e na vida de Henrique, seu pai. Essa prática secular em nossa sociedade é representada ao longo de todo o romance e de várias formas. O livro realiza também em suas páginas uma reflexão sobre o poder transformador da leitura - Henrique é professor e acredita que os livros podem mudar as pessoas -, e esta mudança move os sujeitos, forma consciência coletiva, o que pode ser considerado “perigoso” para aqueles que querem manter ‘cada um em seu lugar’”.
Aluna do curso de Administração, Amanda Oliveira Andrade fala da experiência desta leitura. “O avesso da pele" não é um livro para ser lido com pressa, mas para ser apreciado e olhado em toda sua complexidade. Eu estou achando o livro muito verdadeiro, profundo, cada capítulo enriquece mais a história e a escrita do Tenório é encantadora, a leitura flui muito rápido e os capítulos não são cansativos e desgastantes. Ainda tem muita coisa para acontecer, mas tenho que dizer que ele nos traz um olhar tão sensível sobre o mundo, as vivências negras que como pessoas brancas nem podemos imaginar, assim como até a própria Elis disse, ele nos fala muito sobre a negritude”.
Nas redes sociais
Em sua rede social, a professora Elisângela postou a foto dos alunos com o livro com o texto a seguir:
“Hoje pela manhã, na turma do curso técnico integrado em administração - 3º ano - IFSULDEMINAS - campus Pouso Alegre, começamos a leitura do livro O avesso da pele, escolha literária do trimestre, antes do absurdo de que está sendo alvo este romance impactante, profundo e necessário. Pela primeira vez em quase vinte anos de docência, todos os meus alunos tinham um exemplar em mãos...parece algo tão simples, mas não era até aqui. A posse do livro, o acesso ao exemplar, é um direito inalienável, como já dizia Antonio Cândido, e hoje este direito se concretizou na minha sala de aula, o que foi possível em virtude do PNLD - literário. A alegria não era só minha, dá para ver no rostinho de cada um/cada uma? Foi um momento muito emocionante, por muitos motivos: pela ação de incentivo à leitura e principalmente por ser O avesso da pele a obra escolhida, juntos lemos os primeiros capítulos; eu, com a voz embargada, meus alunos, sem tirar os olhos das páginas. Saí da sala e fiquei pensando o que Henrique (protagonista do livro, também ele professor de literatura) sentiria ao presenciar esta foto, ao ver esta cena... ele estava lá, entre nós, de alguma forma, porque o romance de Jeferson Tenório faz viver e de mãos dadas com estes homens atravessaremos todos os abismos.
"Até o fim você acreditou que os livros poderiam fazer algo pelas pessoas"
Pedro, como seu pai, eu também acredito!
A mensagem chegou ao escritor Jeferson Tenório que respondeu em sua rede social:
Recebi hoje esse registro bonito de uma turma de 3° ano do ensino técnico da IFSULDEMINAS. E o depoimento comovente da professora sobre o Avesso da Pele e o trabalho com a turma. É para isso que estamos lutando contra a censura!
Assessoria de Comunicação
IFSULDEMINAS – Campus Pouso Alegre